Grupo
de Estudos C. G. Jung - dia 16 de julho 2014 -
Algumas palavras da leitura e reflexões - Nise da Silveira
“Primeiro professor de psicologia foi meu pai, professor de matemática e
geometria. Trabalhou também em
jornal. Eu o acompanhava e ia ver como se faz um jornal. Ele
tinha uma grande biblioteca. Tive muita influência de meu pai. Ele fazia todas
as minhas vontades. Tive uma educação excepcional, clássica. Fui muito mimada,
especialmente, por meu pai. Tinha tudo o que desejava.”
“Minha mãe tinha muito humor. Classificava as pessoas; as que gostavam
de cantar das que não gostavam. Para ela estas ela não dava atenção. Minha mãe
sempre cantou muito, e achava que meu problema era que eu não cantava, deveria
cantar.”
“Estudei em colégio de origem francesa. Senhores de engenho com muito
dinheiro, mas espírito para baixo.”
“Cães e gatos são co-terapeutas, amigos fieis capazes de dar e receber
afeto a quem nem era capaz de se comunicar. Os cães e gatos ensinam o amor com
independência. Relacionamento animal e homem, ser humano, é de grande
importância.”
“As pessoas que amam o poder, o comando, não gostam de gatos. Os gatos
são seres livres, não seguem normas. Veio aqui uma senhora cheia de empáfia
para eu participar de um grande evento internacional que ela está organizando,
acontece que de imediato demonstrou aversão aos gatos, foi o suficiente para eu
fizer, ‘não posso, os gatos não permitirão’. Ela foi embora sem entender nada.”
“Meus livros de arte são instrumentos de trabalho. Tenho grandes
paixões, Leonardo da Vinci é um deles. Sou particularmente apaixonada é por
Rembrandt. Ele mergulhava profundamente como Leonardo. Observe a pintura dele.
Se você sonha, você mergulha - o da vigília e o do sonho - dois mundos.”
“O artista, o poeta, mergulha no inconsciente e volta. Já o doente, o
louco, não tem o bilhete de volta. Essa é a diferença.”. “Os esquizofrênicos
são pessoas com antenas sutilíssimas, viajam longe, mas não tem o bilhete da
volta. O poeta tem o bilhete de ida e volta.”
“Jamais quis definir o que é loucura. Compre em escafandro e mergulhe
junto como esquizofrênico.” “Sempre me dirigi aos doentes pelo nome, jamais os
chamo de pacientes. Eu os trato como seres humanos, pessoas. A palavra paciente
me irrita muito.”
“Quando estive em Zurique, em 1957, por ocasião do II Congresso
Internacional de Psiquiatria, ao cumprimentar Jung, ele me disse: ‘A pintura de
seus doentes me causou estranheza, e fiquei nesses dois últimos dias pensando
porquê. Elas são diferentes de outros expositores’. E ele me disse que pinturas
do primeiro plano eram pinturas de doentes com alterações psíquicas, mas que o
fundo de algumas pinturas o perturbou porque havia ali uma diferença entre o
fundo dessas pinturas e a de outros. Que este fundo não era doente, por ser
demasiado harmônico para ser de pessoas que estavam com distúrbios psíquicos.
Eu fiquei estatelada ouvindo. Ele me perguntou em que condições eles pintavam
para que houvesse essa diferença. Respondi que pintavam em ambiente livre e de
maneira espontânea. Perguntou se eu tinha medo do inconsciente, respondi que
não, mas respeito. ‘Trabalha com pessoas que não tem medo do inconsciente’, foi
o que ele acrescentou.”
“Devo ao meu encontro com Jung o interesse pela mitologia. Quando
conheci Jung falei das minhas dificuldades em compreender as ideias delirantes
dos doentes e me queixei das incompreensões dos outros e a minha própria em
relação às imagens desenhadas ou pintadas. Ele, fumando o seu cachimbo, me
olhou atento e depois de um tempo, meio longo, me disse: ‘como você não pode
entender as imagens que você expôs. Elas falam a linguagem dos mitos. Você
estudou mitologia? Respondi que não, o que sabia era muito superficial, não era
matéria a ser estudada. Ele me disse; ‘Se você não conhece os mitos não pode
entender os delírios dos doentes, a pintura que eles fazem’ Fiquei gelada.
‘Essas figuras vem do fundo do inconsciente. A linguagem do inconsciente é a
linguagem mitológica.’ Passei a estudar mitologia a partir das pinturas de
Adelina que disse desejar se flor. Adelina viveu o mito de Dafne. Foi meu
primeiro caso de estudo de mitologia.”
“A inteligência e a sensibilidade do esquizofrênico permanece intacta
mesmo na aparência de estar cingida, em ruínas. Verifica-se
isso com clareza quando encontra alguém com quem ele possa se relacionar
afetivamente.” “A psique, mesmo do esquizofrênico, tem um potencial autocurativo.
Através do afeto forças internas podem se manifestar. O inconsciente se
expressa nas atividades criativas individuais.”
“Psiquiatria é entender o
processo psíquico interno. Os psiquiatras, geralmente, nem olham para os seus
clientes, muito menos nos olhos. Não há cura possível sem relacionamento.”
“O nosso trabalho não visa criar artistas, é um tratamento através das
atividades plásticas. O olhar, as mãos, os gestos podem me dizer alguma coisa.
Sempre estive próxima de artistas plásticos, eles são menos burros que os
médicos. Não sou artista, mas como todo mundo, gosto de arte. Tenho vários
livros de arte aqui na minha biblioteca. Meu interesse pela expressão plástica
é mais no sentido da procura das expressões mais profundas do inconsciente. A
linguagem não verbal diz muito mais que a verbal.”
“Não sei fazer nada sem procurar
uma base mais profunda, sem ler, pesquisar. As referências são fundamentais.” “Não
dissipe as imagens oníricas. O analista corre atrás do cervo, mas não o mata,
tem que pegá-lo vivo, estudá-lo vivo. Tem que pegar a imagem viva e não
estripá-la.”
“Nosso objetivo principal é entrar no mundo interno do doente, é
conhecer este mundo e que ele entre em contato conosco. Não é desejo de que o
doente se expresse de forma artística, o que nós queremos é que ele se expresse
em imagem, como linguagem. O simples fato de desenhar ou modelar é terapêutico.
Ele fica mais leve, diminuem o medo e as tensões.”
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