(continuação texto de Nise da Silveira - módulo II - Casa das Palmeiras - Emoção de Lidar - 1986)
Método terapêutico "O principal método de tratamento empregado na Casa das Palmeiras é a terapêutica ocupacional, mas terapêutica ocupacional num largo sentido, não os mesmos procedimentos praticados correntemente sob esta denominação. Desde minha experiência iniciada em Engenho de Dentro com o método ocupacional, no ano de 1946, a primeira preocupação foi de natureza teórica, isto é, a busca de fundamentação cientifica onde firmar a estrutura do trabalho que estava sendo iniciado. Estudamos com a terapêutica ocupacional poderia ser entendida dos diferentes pontos de vista psiquiátricos (segundo Kraepelin, Bleuler, H. Simon, C. Schneider, neojacksonianos, P. Silvadon, psicanálise, psicologia analítica, etc.).
O objetivo era utilizar a terapêutica ocupacional, se corretamente conduzida, como legítimo método terapêutico e não apenas uma pratica auxiliar e subalterna, segundo acontece habitualmente.
Agora, na Casa das Palmeiras, este método ampliava-se e adquiria novas conotações adequadas a esta instituição destinada ao tratamento e à reabilitação de egressos de estabelecimentos psiquiátricos. Representava a Casa um degrau intermediário entre a rotina do sistema hospitalar, desindividualizada, e a vida na sociedade e na família, com seus inevitáveis e múltiplos problemas, onde a aceitação de egresso não se faz sem dificuldades.
Rótulos diagnósticos são, para nós, de significação menor, e não costumamos fazer esforços para estabelecê-los de acordo com classificações clássicas. Não pensamos em termos de doenças, mas em função de indivíduos que tropeçam no caminho de volta a realidade cotidiana.
Nesse sentido visamos coordenar intimamente olho e mão, sentimento e pensamento, corpo e psique, primeiro passo para a realização do todo especifico que deverá vir a ser a personalidade de cada indivíduo sadio. Na busca de conseguir esta coordenação, fazemos apelo às atividades que envolvam a função criadora existente mais ou menos adormecida, dentro de todo indivíduo.
A criatividade é o catalisador por excelência das aproximações de opostos. Por seu intermédio, sensações, emoções, pensamentos, são levados a reconhecerem-se entre si, a associarem-se, e mesmo tumultos internos adquirem forma.
Jamais temos a pretensão, está claro, que nossos clientes realizem obras de alta qualidade artística (o que às vezes acontece!). Terapeuticamente, o mais importante é que o mundo interno dissociado tome forma e encontre meios de expressão através de símbolos transformadores que o aproximem cada vez mais do nível consciente.
A tarefa principal da equipe técnica da Casa das Palmeiras será permanecer atenta ao desdobramento fugidio dos processos psíquicos que acontecem no mundo interno do cliente através de inúmeras modalidades de expressão. E não menos atento às pontes que ele lança em direção ao mundo externo, a fim de dar a estas pontes apoio no momento oportuno."
(continuação do texto de Nise na próxima edição)