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terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Nise >>>> 15 de fevereiro de 1905 !


Atividades plásticasa - Casa das Palmeiras /2009 e 2010 - guache e pastel oleoso.
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Comemorando aniversário de nascimento de Nise da Silveira, fundadora da Casa das Palmeiras, 15 de fevereiro de 1905, Alagoas, transcreveremos aqui, em três partes, o texto que ela escreveu para o Catálogo de Exposição – Museu de Arte Moderna/ 1975.

Centenário de Jung –
Imagens do Inconsciente.

Parte I
INTRODUÇÃO
Quem estudar demoradamente série de imagens pintadas por esquizofrênicos ficará convencido de que na produção plástica está o caminho menos difícil, para acesso ao mundo interno desses seres tão herméticos.

Quando a imagem se conjuga a informação verbal, tudo se simplifica bastante. Uma pintura abstrata, com linhas quebradas justapostas cerradamente, foi traduzida pelo autor, como representação da ambição. A mesma pessoa em pintura a que deu o nome de “árvore das emoções” revelou código de significação das cores que poderá servir de guia no estudo de suas pinturas; para ele amarelo é glória, rosa, amor; branco, ânsia; marrom, paixão; azul profundo, ciúme. Sem a pintura seria pouco provável descobrir-se que no íntimo daquele homem de aspecto humilde e face à primeira vista impassível permanecessem guardadas secretas ambições nem que no seu mundo interno tivesse raízes uma árvore de intensas emoções.

A pintura revelará muito sobre a maneira como o individuo apreende as coisas, sobre sua visão do mundo. Esta visão depende, em principio, de suas vivências do espaço. A semiologia psiquiátrica tradicional é muito pobre na investigação das perturbações das vivências do espaço. É necessário reconhecer no espaço dimensões subjetivas que o farão parecer claro ou escuro (E.Minkowski), no espaço claro (não se trata de luz física) há distância, há espaço vazio, livre, entre os objetos que se apresentam com suas delimitações nítidas, no espaço escuro, também não se trata de luz física, mas de uma sensação de envolvimento, do individuo sentir-se apertado, oprimido pela obscuricidade, os objetos de tanto estarem próximos imbricam-se, interpenetram-se, resultando daí uma visão caótica do mundo, o estudo atento dos casos de pintura de esquizofrênicos levará o pesquisador a verificar que não está diante de rabiscos tumultuosos lançados a esmo que lhe permitam usar as etiquetas de “deterioração” ou de “demência”, mas de um caos em sentido bíblico, ou seja, da massa confusa de onde todas as coisas tiveram origem.

É comovedor acompanhar, através de centenas de pinturas, os esforços enormes que um homem faz para retirar os objetos do caos, pinçá-los por assim dizer, enquadrá-los para prendê-los, até conseguir dispô-los em arranjos bem próximos daqueles exigidos na faixa da realidade. É o que chamamos a busca do espaço
Cotidiano.

Até ai nos movemos em áreas bastante próximas do consciente, mas não têm medida as profundidades da psique que a produção plástica livre de esquizofrênicos nos poderá fazer vislumbrar.

Fragmentado o ego, desorganizadas as funções de orientação do consciente, caídos os diques que mantinham o inconsciente a distância, revela-se a psique subterrânea, deixando descoberta sua estrutura básica e permitindo que se tornem perceptíveis seus processos arcaicos de funcionamento dos quais se originam os temas míticos (mitologemas).

Foi precisamente a experiência com esquizofrênicos que levou Jung para além das camadas superficiais do inconsciente, dos conteúdos reprimidos que constituem o principal material de trabalho na análise de neuróticos, conduzindo-o a regiões da psique ainda inexploradas.

Médico psiquiatra do hospital Burgholzli, Zurique,no ano de 1906, Jung observou o caso de um esquizofrênico paranóide: dizia o doente que,se movesse a cabeça de um lado para outro olhando o sol, o pênis do sol também se movia e esse movimento era a origem do vento. Mais tarde, Jung encontrou na descrição de visões de adeptos de mitra, publicadas pela primeira vez em 1910, a mesma imagem, a mesma idéia. ”E será visto o chamado tubo, origem do vento predominante. Ver-se-á no disco do sol algo parecido com um tubo, suspenso. E na direção das regiões do ocidente é como se soprasse um vento do leste infinito. Mas se outro vento predominar das regiões do oriente, ver-se-á da mesma maneira o tubo voltar-se para aquela direção”. Num hospital psiquiátrico de Washington, um internado negro, inculto, contou a Jung um sonho no qual era submetido ao castigo de Ixiao, personagem de mitologia grega condenado por Zeus a girar eternamente amarrado a uma roda de fogo.

“Essas e outras experiências semelhantes foram suficientes para indicar-me a solução do problema:
não se tratava de hereditariedade racial especifica, mas de uma característica humana universal. Não se tratava tampouco de idéias herdadas, mas de uma disposição funcional para produzir representações semelhantes ou análogas. A esta disposição dei mais tarde a denominação de arquétipo”. (c.w.5,102).

Pesquisas posteriores continuaram a trazer confirmação para as observações iniciais. Em estudo sobre a esquizofrenia, publicado em 1957, Jung escreve: “Os sintomas específicos da esquizofrenia, na aparência, são caóticos e sem sentido. Entretanto, examinados em profundeza, caracterizam-se, como certos sonhos, por associações primitivas ou arcaicas estreitamente afins com temas mitológicos”. (c.w.3,261).

Foi, portanto da experiência clinica que Jung deduziu os conceitos de inconsciente coletivo e de arquétipo, importantíssimos para a compreensão da própria natureza da psique.
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