(continuação do texto de Nise da Silveira - Módulo VII - Casa das Palmeiras - Emoção de Lidar - 1986)
Psicologia C. G. Jung
Outra maneira de ver a terapêutica ocupacional que poderá conduzir a aprofundamentos teóricos terá como ponto de partida a psicologia junguiana.
Jung, ele próprio, nunca explana diretamente qualquer teoria sobre este método terapêutico. Mas sua psicologia está impregnada de atividade e foi a partir de suas idéias que, principalmente, nos inspiramos.
Jung estuda a correlação entre imagens arquetípicas e instintos, pois, diz ele, não há instintos amorfos, cada instinto desenvolvendo sua ação de acordo com a imagem típica que lhe corresponde. Por que então deixar de utilizar a observação dos impulsos arcaicos que, não raro, irrompe nas psicoses e assim apreender às imagens as quais se acham interpenetrados, imagens essas que constituem a chave da situação psicótica de cada doente?
Escutando o doente, estudando suas pinturas e outras produções, o observador verificará que a matéria prima de seus delírios é constituída de idéias e imaginações arquetípicas, soltas ou agrupadas em fragmentos de temas míticos. Se o observador sofre da deformação profissional característica do médico, inclinar-se-á a ver nas criações da imaginação coisas inconsistentes ou patológicas e rotulará apressadamente essas idéias, imaginações e ações como material produzido pela doença. Mas, se tomar posição fora de dogmas preestabelecidos, irá defrontar processos psíquicos surpreendentes. Irá vislumbrar a estrutura mesma da psique, nos seus fundamentos e no seu dinamismo.
Foi o que fez Jung nos seus estudos psiquiátricos. A terapêutica ocupacional muito lucrará em aplicar esses estudos em profundeza e estendê-los no seu campo de trabalho.
Ainda outros dados. A psicoterapia junguiana tem por meta não só a dissolução de conflitos intrapsíquicos e de problemas interpessoais, mas favorece também o desenvolvimento de “sementes criativas” inerentes ao indivíduo e que o ajudam a crescer. Acontece que é justamente em atividades feitas com as mãos que, muitas vezes, se revela a vitalidade dessas “sementes criativas”, segundo presenciamos na Casa das Palmeiras.
Nos neuróticos esse fenômeno se apresenta freqüentemente. Jung escreve: “Se houver alto grau de crispação do consciente, muitas vezes só as mãos são capazes de fantasia”. Quando o ego não se acha muito atingido, a teoria das quatro funções de orientação da consciência no mundo exterior: pensamento, sentimento, sensação, intuição, se bem utilizadas em atividades que as mobilizem de acordo com suas deficiências, poderá ajudar bastante o individuo a obter melhor equilíbrio psíquico.
Parece-me que a psicoterapia conceda ainda muito pouco valor à ação orientada com objetivo terapêutico. Despreza um belo campo de pesquisa.
Aplicando à terapêutica ocupacional as descobertas de Jung abrem-se novas perspectivas para este método, tanto para neuróticos como para psicóticos.
(continuação do texto de Nise na próxima edição)
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