domingo, 13 de junho de 2010

Imagens do inconsciente






Desenhos do ateliê de pintura / 2010 -
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Mostra dos trabalhos entre os próprios criadores.
Espaço em que cada um expõe suas obras e dialoga com seus pares sobre a realização dos mesmos. Onde as trocas de opiniões se fazem espontâneas; o silêncio da observação contemplativa e a palavra estão presentes.
Um ateliê vivo - todos se interagem neste momento do olhar voltado para rever a sua própria produção, assim como a dos seus companheiros/as das atividades plásticas.
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Acervo da Casa das Palmeiras
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Texto de Nise da Silveira

Introdução do Catálogo da Exposição – Museu de Arte Moderna – 1975.

Centenário de C. G. Jung – Imagens do Inconsciente.

Quem estudar demoradamente série de imagens pintadas por esquizofrênicos ficará convencido de que na produção plástica está o caminho menos difícil para acesso ao mundo interno desses seres tão herméticos.

Quando à imagem se conjuga a informação verbal tudo se simplifica bastante. Uma imagem abstrata, com linhas quebradas justapostas cerradamente, foi traduzida pelo autor, como representação de ambição. A mesma pessoa em pintura a que deu o nome de “árvore das emoções” revelou código de significação das cores que poderá servir de guia no estudo de suas pinturas. Para ele amarelo é glória; rosa, amor; branco, ânsia; marrom, paixão; azul profundo, ciúme. Sem a pintura seria pouco provável descobrir-se que no intimo daquele homem de aspecto humilde e face à primeira vista impassível permanecessem guardadas secretas ambições nem que no seu mundo interno tivesse raízes uma árvore de intensas emoções.

A pintura revelará muito sobre a maneira como o individuo apreende as coisas, sobre sua visão do mundo. Esta visão depende, em principio, de suas vivências do espaço. A semiologia psiquiátrica tradicional é muito pobre na investigação das perturbações das vivências do espaço. É necessário reconhecer no espaço dimensões subjetivas que o farão parecer claro ou escuro (E. Minkowski). No espaço claro (não se trata de luz física) há distância, há espaço vazio, livre, entre os objetos que se apresentam com suas delimitações nítidas. No espaço escuro, também não se trata de luz física, mas de uma sensação de envolvimento, do individuo sentir-se apertado, oprimido pela obscuridade. Os objetos de tanto estarem próximos imbricam-se, interpenetram-se, resultando daí uma visão caótica do mundo. O estudo atento dos casos na pintura de esquizofrênicos levará o pesquisador a verificar que não está diante de rabiscos tumultuosos lançados a esmo que lhe permitam usar as etiquetas de “deterioração” ou de “demência”, mas de um caos em sentido bíblico, ou seja, da massa confusa de onde todas as coisas tiveram origem.

É comovedor acompanhar, através de centenas de pinturas, os esforços enormes que um homem faz para retirar os objetos do caos, pinçá-los por assim dizer, enquadrá-los para prendê-los, até conseguir dispô-los em arranjos bem próximos daqueles exigidos na faixa da realidade. É o que chamamos a busca do espaço cotidiano.

Até ai nos movemos em áreas bastante próximas do consciente. Mas não tem medida as profundidades da psique que a produção plástica livre de esquizofrênicos nos poderá fazer vislumbrar.

Fragmentado o ego, desorganizadas as funções de orientação do consciente, caídos os cliques que mantinham o inconsciente a distância, revela-se a psique subterrânea, deixando descoberta sua estrutura básica e permitindo que se tornem perceptíveis seus processos arcaicos de funcionamento dos quais se originam os temas míticos (mitologemas).

Foi precisamente a experiência com esquizofrênicos que levou Jung para além das camadas superficiais do inconsciente, dos conteúdos reprimidos que constituem o principal material de trabalho na análise de neuróticos, conduzindo-o a regiões da psique ainda inexploradas.
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