sábado, 1 de março de 2008

VI Que é a Casa das Palmeiras

(continuação do texto de Nise da Silveira - Módulo VI - Casa das Palmeiras - Emoção de Lidar- 1986)
Elementos da Natureza
Além do que foi dito, há ainda muitas coisas a estudar no exercício das atividades concernentes ao mesmo tempo à psicologia profunda e ao tratamento dos distúrbios emocionais.
Um dos temas teóricos preferidos por nós é o da natureza dos materiais usados nas atividades e as variações de adaptação e de preferência dos clientes pela manipulação desses materiais.
É curioso que haja sido um filósofo, Gaston Bachelard, quem abriu caminho para a pesquisa da importância psicológica dos materiais de trabalho. Ele investigou a atração preferente da imaginação criadora, em escritores e poetas, pelos elementos da natureza aos quais aqueles se achavam originariamente filiados: ou seja, que a imaginação procura uma substância de preferência para revesti-se: fogo, água, ar ou terra. Assim, revelam “segredos íntimos” (La terre et les révéries de la volonté). Bachelard, baseado nessas idéias, criou um novo tipo de crítica literária de grande repercussão, sobretudo na França. Mas transbordou da área da filosofia e da literatura para demonstrar a significação dos elementos da natureza na vida, no trabalho do homem normal e mesmo seu valor curativo para os distúrbios emocionais. “A saúde de nosso espírito está em nossas mãos”, escreve Bachelard (La terre et les révéries du repos): isto é, na manipulação dos elementos da natureza que convêm à nossa condição psicológica.
O psiquiatra Paul Sivadon teve o mérito de trazer para o campo da psiquiatria as idéias de Bachelard e de aplicá-las à terapêutica ocupacional.
Estudando as condições de adaptação do doente às diferentes atividades, Paul Sivadon foi levado a estabelecer nelas uma hierarquia dos materiais utilizados, baseados principalmente na sua maleabilidade ou resistência e na sua mutabilidade, ou seja, nas suas possibilidades maiores ou menores de transformação. Ele observou que os materiais são tão melhor aceitos quanto mais próximos estejam da natureza: plantas, animais; quanto mais dóceis: barro, fibras, madeira tenra: mais fecundos – de pequenas coisas sem valor construírem outras agradáveis à visão e mesmo úteis: mais mágicos – materiais que se transformam facilmente, tais como as tintas que saltam de tubos levemente apertados e que, misturadas a outras produzem cores diferentes: o barro, o gesso, maleáveis quando úmidos, mas que depois endurecem fixando formas.
(continuação do texto de Nise na próxima edição)

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